terça-feira, 18 de maio de 2010

Nutrição Activa: Aceita o desafio?

Mafalda Faria (à esquerda) e Tânia Magalhães (mais a baixo, à direita) são duas nutricionistas que trabalham no âmbito dos Cuidados de Saúde Primários há cerca de 10 anos. As suas principais actividades prendem-se com a consulta individual de nutrição (no ambulatório e no domicílio) e trabalho comunitário dirigido a crianças e à população em geral. Estas nutricionistas integram equipas multidisciplinares e promovem a saúde das populações através da disseminação dos conceitos de alimentação saudável, integrados num todo de estilo de vida saudável. Desenvolvem trabalho ao nível das escolas, em parceria com juntas de freguesia, lares e centros de dia e todas as instituições da comunidade que recorram aos seus serviços.

Recentemente desenvolveram o projecto Nutrição Activa.

 
1- Em que é que consiste o Projecto Nutrição Activa?
O projecto Nutrição Activa, desenvolvido pelas nutricionistas Mafalda Faria e Tânia Magalhães, surge da necessidade de disseminar actividades com enfoque na (RE)Educação Alimentar. Individualmente ou em contexto de grupo, o objectivo da Nutrição Activa é fornecer as estratégias imprescindíveis para uma saudável selecção de alimentos a consumir ao longo do dia, um doseamento correcto das quantidades de alimentos a consumir em refeições estruturadas e saber fazer as substituições entre famílias de alimentos. Tudo isto para que a alimentação do dia-a-dia seja equilibrada, sem ser monótona, e permita aumentar a aporte nutricional a cada indivíduo. A médio prazo espera-se que a pessoa tenha uma nova visão sobre alimentação e que esta se traduza na aquisição de novos hábitos alimentares.

As actividades da Nutrição Activa abrangem as áreas da Nutrição Clínica, Promoção da Alimentação Saudável e Higiene e Segurança Alimentar.

A missão da Nutrição Activa é garantir aos seus clientes a qualidade na prestação de serviços técnicos e especializados na área da nutrição, de forma contínua e progressiva, visando sempre o bem-estar mental e corporal de cada um.
2- De que forma a alimentação pode contribuir para o bem-estar e equilíbrio do corpo?

Uma alimentação saudável contribui para o bem-estar do organismo por fornecer o conjunto de nutrientes necessários ao seu pleno funcionamento. Emílio Peres, considerado o “pai” dos nutricionistas em Portugal, via a alimentação como o factor ambiental que mais interfere na saúde e na duração de vida. “O bem-estar proporcionado por uma alimentação resulta do equilíbrio balanceado entre os alimentos que se consomem, a sua qualidade higiénica e nutricional, bem como do ambiente emocional das próprias refeições”.

3- E em que é que se traduz uma alimentação saudável?

A noção de alimentação saudável, além da componente nutricional, tem subjacentes conceitos de foro cultural, principalmente no que diz respeito à escolha de alimentos. Em Portugal, uma forma simples, prática e fácil de interpretar as noções de uma alimentação saudável é através da Roda dos Alimentos (http://static.publico.clix.pt/docs/pesoemedida/Panfleto_Roda_Alimentos.pdf). A Roda dos Alimentos é um guia que apresenta alimentos saudáveis de consumo corrente em Portugal e transmite as seguintes orientações:

Alimentação completa – aquele em que, diariamente se consome alimentos de cada grupo e se bebe água;

Alimentação equilibrada – significa comer maior quantidade de alimentos pertencentes aos grupos de maior dimensão e menor quantidade dos que se encontram nos grupos de menor dimensão, de forma a ingerir o número de porções recomendado;

Alimentação variada – traduz-se em comer alimentos diferentes dentro de cada grupo variando diariamente, semanalmente e nas diferentes épocas do ano.

Através do consumo desta combinação de alimentos traduzida pela Roda dos Alimentos conseguimos obter um conjunto equilibrado de variados nutrientes que cumprem uma ou mais funções específicas no nosso organismo. Por outro lado, o organismo sofre quando lhe faltam determinados nutrientes ou quando estes são fornecidos em excesso. As diversas carências de vitaminas são exemplos de défice e a obesidade pode exemplificar o excesso de fornecimento de nutrientes ao organismo. Ambas as situações traduzem desequilíbrio.

4- A Alimentação pode ter impacto na saúde mental do indivíduo?

A Alimentação tem impacto em todo o organismo de um indivíduo. Assim, a qualidade nutritiva do que se consome tem reflexo na saúde do cérebro.
Por outro lado, a obesidade está identificada como um factor de risco da depressão, bem como a própria depressão é um factor preditivo do desenvolvimento da obesidade. Havendo aqui uma relação bidireccional, a manutenção de um peso saudável, através de um estilo de vida saudável, revela-se fundamental.
O carácter epidémico da depressão tem levado ao estudo de determinantes alimentares com contributo na origem das doenças mentais. Considerando que tudo o que compõe o cérebro vem da nossa alimentação e que o cérebro humano é composto por cerca de 60% de gordura, o estudo dos ácidos gordos como determinantes da integridade e capacidade de funcionamento do cérebro tem vindo a desenvolver-se ao longo dos anos. Uma alteração clara na alimentação da população mundial tem sido a diminuição do consumo de alimentos ricos em ácidos gordos da série n3 (como por exemplo peixes gordos – sardinha, carapau, cavala, atum, salmão, perca, corvina – e frutos oleaginosos – nozes, amêndoas, avelãs) e aumento de consumo de alimentos ricos em ácidos saturados (gordura da carne de vaca salsichas, alheiras, chouriços, morcelas, fritos resultantes da utilização de óleo de palma, óleo de coco), trans (snacks, bolachas, tostas) e da série n6 (óleos de amendoim, soja, girassol, milho). Estes ácidos gordos têm acções diferentes ano desenvolvimento e funcionamento do cérebro. Há já estudos que demonstram uma associação positiva entre o consumo dos alimentos ricos em ácidos gordos da série n3 e o desenvolvimento cerebral pré-natal e durante a infância, bem como o desenvolvimento de diferentes estados de humor.
Foi recentemente publicado um estudo australiano que avaliou a associação entre a qualidade da alimentação e a incidência de depressão na adolescência – período em que é comum observar o desencadear de doença psiquiátrica e depressão. Os resultados deste estudo demonstram que essa associação existe e é independente das influências socioeconómicas, familiares e outros possíveis factores confundidores. Os resultados de um estudo semelhante, realizado em adultos americanos de baixos recursos económicos, foram publicados estes mês, indicando uma associação significativa entre a qualidade da alimentação, de acordo com uma escala de alimentação saudável, e a sintomatologia depressiva. Neste estudo, os indivíduos com uma escala de alimentação mais saudável reportaram menos sintomas de depressão.

 
5- Estão já identificados alimentos específicos para serem consumidos por pessoas depressivas ou em estados de ansiedade?

 
O contrário sim, isto é, há estudos que demonstram que diferentes estados de ansiedade influenciam aquilo que se escolhe para comer. Por exemplo, estados de depressão foram recentemente associados a maior consumo de chocolate. Ainda não se sabe bem o mecanismo pelo qual actua, mas pensa-se que alguns componentes do chocolate estarão associados à sensação de recompensa e aumento da motivação.

Por outro lado, não há evidência científica clara que associe o consumo de açúcar e a diminuição do défice de atenção, demência ou depressão.

Já salientamos que o consumo alimentos ricos em ácidos gordos da série n3 (como por exemplo peixes gordos – sardinha, carapau, cavala, atum, salmão, perca, corvina – e frutos oleaginosos – nozes, amêndoas, avelãs) no desenvolvimento de diferentes estados de humor.

Vários outros estudos tentam identificar alimentos que diminuam o risco dos estados depressivos ou ansiosos.
Um estudo Finlandês avaliou o risco de depressão severa, em homens de meia-idade, e a sua associação com o consumo de café, chá e cafeína. Neste trabalho, identificou-se o café como um potencial factor de diminuição do risco de ocorrência de depressão. Os resultados para o consumo de chá e da cafeína, isoladamente, não foram conclusivos.

O nível de folatos (nutriente presente em vegetais de cor verde escura, como brócolos, espinafres, couve galega, penca, entre outros) está identificado como um factor nutricional com potencial para diminuir a ocorrência de depressão na fase final da vida do indivíduo.
Também em algumas especiarias, como o açafrão da Índia e o caril, e fontes alimentares de vitamina D (presente no fígado de peixe, peixes gordos, cogumelos e o sol) estão identificadas substâncias que actuam na diminuição de défice cognitivo.
No entanto, são ainda necessários mais estudos longitudinais que avaliem o potencial dos determinantes alimentares para prevenir a depressão

 
6- Na sua experiência pessoal e profissional o que falta para o ser humano ser feliz?

Bom, nesta questão tentarei inicialmente separar a minha experiência pessoal da minha experiência profissional e, no final da minha resposta, procurarei cozinhar estes dois ingredientes juntos.
Pessoalmente, considero que todo o ser humano tem em si todo o potencial para viver momentos de felicidade. A questão é descobri-lo e manter-se em contacto com a nossa fonte de felicidade interior. Está em todos nós! Todos podemos (e devemos!) aproveitar diariamente os bons momentos de cada dia que vivemos. E, é verdade! Todos os dias vivemos momentos bons e felizes. No último ano iniciei um exercício no final do dia. Ao deitar-me registo 5 momentos felizes do meu dia. Encontro sempre e às vezes até ultrapasso os 5! Outros dias repito um bom momento para o saborear a dobrar de modo a que ele possa valer por mais! Bom, mas isto é um ponto de vista muito pessoal! Acredito que cada um deve descobrir o seu caminho para saborear momentos felizes em cada dia!!
Do ponto de vista profissional, acredito que o ser humano será mais feliz quando estiver disponível para a mudança. Como nutricionistas recebemos muitas pessoas que desejam ter menos peso do que aquele que têm, desejam uma imagem corporal diferente, mais atractiva, adelgaçada, mais atlética até. No entanto, é quase um paradoxo perceber que as pessoas estão disponíveis a dar muito pouco delas mesmas para conseguir os seus resultados. Querem tudo para “ontem”, de forma rápida e se houver uma “pílula milagrosa” que as faça atingir o peso e imagem corporal desejadas tanto melhor! É urgente que as pessoas percebam que para serem felizes as mudanças devem começar nelas próprias e se querem ter menos peso têm de aprender a comer para conseguirem o peso que desejam atingir e manter, se pretendem uma figura adelgaçada têm que fazer exercício físico. É certo que alguns indivíduos têm uma genética favorecedora, mas até esses podem ter um momento na vida a partir do qual o metabolismo muda e a alimentação deve acompanhar essa mudança. É necessária disponibilidade individual para atingir os objectivos pretendidos. Como nutricionistas estamos cá para ajudar, através de informação, da identificação de pequenos obstáculos que possam surgir, das estratégias para os ultrapassar, mas é fundamental que se compreenda que o caminho tem de ser feito por cada um.
E, desta forma, talvez consiga juntar os ingredientes dos meus pontos de vista pessoal e profissional num cozinhado que contribua para nutrir a felicidade do ser humano: uma boa dose do potencial de cada indivíduo, outra porção do momentos diários de felicidade e quilogramas de vontade para mudar na direcção do caminho que nos leva à concretização dos nossos objectivos. Mistura-se tudo, leva-se a lume brando diariamente, acrescentam-se sorrisos e sairá muita felicidade para cada um de nós! Bem-haja!

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